Uma questão de tempo ...
Há muito, muito tempo, era eu uma criança ... tinha uns oito, nove anos, os meus pais ofereceram-me aquele presente de aniversário... uma bicicleta!
Podem imaginar a euforia desta miúda. Lembro-me de nem dormir, só de pensar que no dia seguinte ia estrear a minha bicicleta nova.
Os domingos eram divididos em: ir à missa de manhã, almoçar e ir para a rua brincar.
Num desses domingos, assim já ao final do dia, a regressar a casa, ganhei balanço numa descida, uma carrinha de caixa aberta a fazer marcha atrás não me viu, eu não consegui travar a tempo, e esbardalhei-me contra a carrinha.
Seis pontos no queixo, um braço empanado, e a minha bicicleta directa para o lixo de toda encraquelhada que ficou.
Depois disso, nunca mais andei de bicicleta. Cada vez que subia numa, as pernas começavam a tremer, o medo subia por mim acima e eu empacava.
E também nunca mais quis ter uma bicicleta na vida. Passei a ter uma grande aversão por tudo que tivesse duas rodas.
Até à dois anos atrás, em que decidi que estava na altura de superar esta fobia.
E no dia em que fiz cinquenta anos ofereci-me uma bicicleta.
As pessoas desta casa, conscientes das minhas exímias capacidades como ciclista, quando souberem da minha nova aquisição, ligaram-me. A minha mais velha a perguntar se tinha comprado capacete e joelheiras. O meu mais novo para saber se tinha comprado as rodinhas. Até são miudos fixes ...
O meu pai liga-me a pedir para ter juízo e a lembrar-me desse episódio já com séculos, e ao fundo ouvia-se a voz da minha mãe que dizia, esta rapariga ... esta rapariga!
A bicicleta não foi aprovada pela família!
Mas eu estava determinada e como me diz uma amiga minha: quando metes uma coisa na cabeça, é mais fácil arrancarem-te a cabeça!
Sou assim e não tenho tempo para mudar.
No primeiro dia que saímos juntas, andámos mais tempo de mão dada. Não vale rir! Mas sim, empurrei mais do que pedalei ...Tinhamos de nos conhecer bem, certo?
Mas ... como na vida é tudo uma questão de tempo, insistência e garra, a minha bicicleta e eu, fomos ultrapassando os medos, e hoje somos excelentes companheiras de passeatas!
Se ainda tenho medo? Tenho! Ainda me tremem as pernas...
Se sou uma excelente ciclista? Não! Mas ando devagar, consigo mesmo ser ultrapassada por malta que anda a correr. Volta e meia tropeço nos pedais, e já consegui cair numa subida porque me atrapalhei a meter as mudanças. Mas atenção! Não sou o "perigo das ciclovias"
Dia após dia a confiança foi aumentando e em novembro do ano passado, quando me lançaram o desafio de conhecer a costa algarvia de bike, aceitei sem pensar duas vezes, e foi uma das experiências mais espectaculares da minha vida!
Este ano mais aventuras nos esperam! Juntas, claro!